Startups levam colaboração e tecnologia para educação órfã de ambos

Startups levam colaboração e tecnologia para educação órfã de ambos

Edtechs potencializam possibilidades de conexão e inovação, unindo educadores e estudantes na busca pelo conhecimento.

748. Segundo a Associação Brasileira de Startups, ABStartups, esse é o número de empresas do tipo no segmento de educação. Também conhecidas como Edtechs, estão tangibilizando o que são as demandas por inovação em todos os níveis, especialmente em relação às metodologias de aprendizagem.

“As Edtechs, juntamente com as instituições de ensino, já estão transformando a educação no Brasil e no mundo. Um exemplo que gosto de citar é a micro aprendizagem, que, utilizando diferentes tecnologias, pode customizar o ensino com detalhamento e especificidade inviáveis até há bem pouco tempo”.

O autor da declaração é Leo Gmeiner, criador e diretor do Filho sem Fila e diretor do Comitê de Edtechs da ABStartups. Ele ainda ressalta que só se transforma a educação por meio das oportunidades que o próprio setor apresenta. “A única maneira de fazer isso de forma eficaz e efetiva é ouvindo o que gestores, educadores, alunos e pais têm a dizer para entender profundamente os problemas e transformá-los em oportunidades de melhoria”, disse, em entrevista exclusiva para o site da Liga, num entendimento de que colaboração é potência para o processo de inovação.

 

Programas “tradicionais” como impulso para a inovação

A fala de Leo vai ao encontro da história da plataforma Jovens Gênios, criada por Bernard Caffé Figueiredo e Fernando Costa no final de 2017, no ciclo de aceleração da USP de Ribeirão Preto, para melhorar o ensino da matemática. A plataforma é ofertada diretamente para as escolas, que a incorporam ao processo de aprendizagem.

“Eu havia acabado de fazer um intercâmbio pelo programa Ciência Sem Fronteiras, na Alemanha, havia conhecido diversas metodologias de aprendizagem em viagens para a Jordânia e Berlim, por exemplo. Voltei para o Brasil com o desejo de fazer algo para manter os estudantes motivados”, lembra Bernard.

Já Fernando, outro sócio fundador da Jovens Gênios, é desenvolvedor e especialista em inteligência artificial. Em 2017, havia desenvolvido para os irmãos, com então 11 e 13 anos, uma plataforma de exercícios e correção automática com gamificação, e achava que faria sentido criar algo para outros pais.

“Nosso propósito foi transformar a educação, com tecnologia, inovação e democratização. Por isso que 20% da nossa base de usuários é totalmente gratuita. Temos parceria com a Fundação Darcy Vargas, a ONG Mundo Novo, algumas escolas estaduais, que utilizam a plataforma sem custo. Toda escola privada financia de alguma forma o uso dentro de uma escola pública”, explica Bernard.

 

Abordagem compartilhada, centrada no estudante

Leo Gmeiner ressalta que a qualidade no ensino é um dos grandes desafios da educação no país. “As instituições têm a oportunidade de se aliar às startups e fazer uso desse momento único em termos de tecnologia aplicada ao ensino, que pode, desde a educação básica, contribuir para melhorar o quadro geral da educação brasileira”, acredita.

Bernard complementa, ressaltando a importância do professor como parte integrante no processo de adaptação às novas metodologias, tangíveis em apps e demais plataformas de apoio à aprendizagem.

“A gente precisa dos professores. Eles são super-heróis e as nossas ferramentas existem para aumentar seus superpoderes”, ilustra, ressaltando a importância de discutir a formação docente.

 

Professores como aliados na quebra de paradigmas

Mudar cultura, entretanto, é um desafio em qualquer segmento ou setor da sociedade, e, na educação, não é diferente. “As escolas estão cada vez mais abertas a considerar novas tecnologias em seu dia-a-dia e isso é muito positivo”, comemora Leo. Para ele, esse é o primeiro passo do processo de inovação, que depois permite compreender como e quais tecnologias podem contribuir para a gestão escolar, metodologia e aprendizado dos estudantes.

“Idealmente, somente depois disso a instituição deverá abraçar, paulatinamente, as Edtechs. E digo paulatinamente pois, além da adaptação das equipes e estudantes, ainda há a questão do investimento necessário à inovação”, alerta, ressaltando, também, a formação do educador como ponto central para que as novas metodologias e tecnologias “peguem” uma vez implantadas.

Bernard concorda. Ele, que já atuou em sala de aula com mais de 60 horas-aula semanais, acrescenta a urgência de valorização da categoria.

“O professor sofre diversos assédios morais no dia a dia, principalmente na educação pública, sofre casos de violência, remuneração baixa, alta carga de trabalho... tudo isso traz uma dificuldade muito grande de inovar e sair da zona de conforto, porque ele não tem ambiente para isso”.

 

Diferença entre gerações

A experiência do Jovens Gênios ensina que também os pais precisam ser sensibilizados para o que é a aprendizagem 4.0, que resulta no domínio de competências integradas, de forma independente. “Como aprenderam no modelo tradicional, muitos acham que se os filhos estão numa aula gamificada, uma aula invertida, o professor é preguiçoso”, constata Bernard.

Já para os alunos, a sensação é a de que nem percebem que estão estudando, pois, com a plataforma, a matemática vira um campeonato de pontos corridos, um desafio para qualificar o avatar, dentre outros elementos que engajam o estudante no processo e fazem com que aprender seja natural e divertido, além de reforçar o entendimento de que nenhum conhecimento por si só é capaz de responder completamente aos desafios da sociedade, estimulando o desejo por ir além.

 

Desconectados e distantes até quando?

Apesar de já expressiva no Brasil, a realidade das Edtechs ainda é distante da rotina do jovem estudante. Estudo divulgado com exclusividade pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) para o telejornal Bom dia Brasil, da TV Globo, na quinta-feira, 24/10, trouxe dados que atestam que sem mudanças na mentalidade educacional, corremos o risco de perder mais uma geração para subempregos: apenas 20% dos jovens entre 16 e 29 anos já perceberam a importância da tecnologia na formação profissional. 

Quando perguntados sobre temas altamente discutidos no mundo do trabalho, da pesquisa e do conhecimento, como big data, biotecnologia, entre outros, menos da metade respondeu saber, como apontam os dados abaixo:

  • Big data – 39%

  • Impressoras 3D – 37%

  • Inteligência artificial – 36%

  • Computação em nuvem e realidade virtual aumentada – 35%

  • Robótica – 30%

  • Biotecnologia e automação de processos – 28%

A reportagem traz, ainda, um dado alarmante: 46 milhões de vagas podem desaparecer somente no Brasil nos próximos anos, por causa da automação. Enquanto isso, 76% dos entrevistados responderam achar que aprendem melhor numa sala de aula tradicional.

Os números reforçam a responsabilidade compartilhada entre todos que compõem o setor da educação. Ampliação do uso de metodologias e da tecnologia nas salas de aula, professores atualizados e conscientes de que novas ferramentas potencializam sua capacidade de transformação, bem como um trabalho conjunto para mudança na mentalidade dos jovens sobre o que são espaços de aprendizagem, podem ser capazes de ampliar o conhecimento e as habilidades necessárias para as novas gerações se inserirem de forma satisfatória nessa sociedade em transformação acelerada.

Escrito por Cecília Seabra

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